Na
Segunda-feira, 11/12, ocorreu a votação da Licença Prévia e de Instalação da
terceira fase do projeto Minas-Rio, da Anglo American, em Conceição do Mato
Dentro, na região central de Minas Gerais. A reunião foi rápida, pois os
conselheiros do COPAM pediram vistas e a votação foi adiada. Quando começaram a
chegar os representantes das comunidades atingidas pelo projeto – mais de 70
pessoas, vindas de oito comunidades vizinhas ao empreendimento – vários
diretores da empresa saíram às pressas. Outros que ficaram expressaram seu
desconforto com a presença popular e pediram escolta policial.
“Era
uma intervenção quase silenciosa, com cruzes e cartazes”, pontua Maria Júlia
Gomes de Andrade, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, que ajuda a
organizar as famílias. “O contraste entre os diretores da mineradora e o povo
ficou muito claro”, acrescenta.
As
licenças que seriam votadas permitiriam que a empresa pudesse começar a fase
conhecida como “Step 3” de seu projeto de mineração na região, o que inclui a
expansão da cava, que chegará a 12 km, e ampliação da barragem de rejeitos. O
projeto prevê 28 anos de exploração de minério de ferro na região.
“Depois
do que aconteceu em Bento Rodrigues, quem confia em segurança de barragem de
rejeitos?”, questiona Lúcio da Silva Pimenta, da comunidade Mumbuca. O
lavrador, que foi um dos autores de uma ação popular pedindo o cancelamento de
uma audiência sobre o projeto até que houvesse mais transparência, foi expulso
de seu terreno e hoje vive em um galpão perto da estrada. “Nós não queríamos
sair de casa. Mas, já que somos obrigados, o mínimo que a empresa deveria fazer
é um reassentamento com dignidade”, pontua.
Ele
elenca outros problemas da ampliação, como o mau cheiro, o barulho, a
mortandade de peixes, a dificuldade de produzir e trabalhar e outros. Mas o que
mais parece apavorar a todos é a imensa pilha de rejeitos, que só tende a
crescer.
“Moro
na segunda casa mais perto da barragem. Se ela romper, será a segunda casa
atingida”, cita Elizete Pires, da comunidade Passa Sete. Ela também participou
do protesto na secretaria de meio ambiente e indica que outros jovens deveriam
fazer o mesmo. “Vim buscar meus direitos e falar que os jovens têm que se
organizar, porque é nosso sonho que está lá, envolvido naquilo tudo. Se a
barragem estourar, é nosso sonho que vai embora”, alerta.
Ivanilde
Pacífica Neves mora em outra comunidade vizinha, São José do Jassém. Apesar de
estar a menos de 10km da barragem, a empresa não os reconhece como atingidos ou
como moradores de área de risco. “Nas reuniões que fazem lá, os representantes
das empresas dizem que, caso a barragem estourar, vamos ter 2h25 minutos para
sair de casa. Chegaram a instalar uma sirene no local. Aí pergunto: se não é
área de risco, para que sirene?”, questiona.
Quando
o assunto são os impactos do projeto, muitos chegam perto para acrescentar
outro elemento. “Nós tínhamos água limpinha perto de casa, várias nascentes.
Agora é caminhão pipa, e pouca água”, lembra José Lúcio Reis dos Santos,
“nascido e criado”, na comunidade Água Quente. Ele acrescenta ainda as
promessas de emprego que a empresa faz sempre que “quer algo na região” e que
depois não se concretizam para os moradores de lá. “Faz uns 90 dias que abriram
inscrição e até hoje não chamaram ninguém”, diz.
Invanilde,
José Lúcio, Elizete e Lúcio insistem num ponto: não há reconhecimento dos
impactos nem indenização ou reassentamento aos atingidos.
Juliana
Deprá, do MAM, afirma que esse é um dos principais pontos de reivindicação. “As
comunidades mais próximas da barragem têm muito forte a pauta do
reassentamento. Mas outra necessidade é denunciar as violações, que são de
vários tipos, como poeira, barulho, falta de água, contaminação, mortandade de
peixes. E tudo isso vai se acirrar com o ritmo da exploração aumentado”,
acrescenta.
Licenciamento
No
dia 5 de dezembro, o Conselho Gestor da Serra da Ferrugem aprovou o pedido de
expansão da mineradora no município de Conceição do Mato Dentro. No entanto, o
Ministério Público Estadual entrou com uma ação civil pública no dia 7, pedindo
a nulidade da autorização. A Juíza da comarca de Conceição do Mato Dentro,
Carolina de Rodrigues de Queiroz, autorizou a liminar para suspender os efeitos
da autorização. “A continuidade do empreendimento de mineração na zona de
amortecimento da unidade de conservação e no entorno do bem tombado poderá
causar danos irreversíveis ao meio ambiente natural, cultural e paisagístico”,
diz trecho da sentença. A Anglo já entrou com recurso para rever a decisão.
Segundo
o Promotor Marcelo Mata Machado, o MP está acompanhando a situação das
comunidades. “Em relação as remoções, o
Ministério Público está monitorando a situação, uma vez que o Estado de Minas
Gerais e a própria Anglo American sustentam que as remoções são voluntárias e
não obrigatórias. Nesse sentido, o Ministério Público está exigindo que os
atingidos sejam acompanhados por uma assessoria técnica independente e multidisciplinar”,
afirma.
Em
nota, a Anglo American declarou que a “Etapa 3 é fundamental para a
continuidade da operação da empresa e irá permitir que o Minas-Rio produza 26,5
milhões de toneladas de minério de ferro por ano, volume planejado desde o
início do empreendimento”. A empresa diz ainda que serão gerados 800 postos de
trabalho (no pico da construção) e 100 empregos permanentes depois que as obras
forem concluídas.
“Esses
empregos virão se somar aos cerca de 4.500 empregos diretos e indiretos já mantidos
pelo empreendimento. Os investimentos
serão da ordem de R$ 1 bilhão”, diz. A votação das Licenças Prévia e de
Instalação na Câmara Técnica Especializada de Atividades Minerários, em Belo
Horizonte, está prevista para acontecer ainda em dezembro.
“O
projeto já existe, não está mais no papel. Agora vamos nos organizar e lutar
para que as pessoas possam voltar a ter uma vida digna”, afirma Maria Júlia, do
MAM.
Fonte: Brasil de Fato.